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    M.A.D.

    fazer casa num silo nuclear da guerra fria
    de um harmônico descompasso mundial
    de um eterno estado de agonia

    míssel balístico intercontinental
    louco para voar
    louco para explodir
    adquiriu vida própria
    e pôs-se a sorrir perante a situação
    de tanto poder e ter que esperar
    que liberem as amarras
    abram o silo
    e o deixem escapar

    pulsa
    pulsa um míssel nuclear
    pulsa um coração posto a esperar
    que as tensões mundiais se agravem
    e acabem por detonar a primeira ogiva
    que arrasará a primeira cidade
    que causará a primeira enchente termonuclear
    que causará retaliação
    perturbação na ordem mundial
    que causará pânico
    euforia e agitação

    (paixão)

    Vladimir Campos
    27 de julho de 1995

    Contexto.

    A Guerra Fria era tema frequente nas telas de cinema, capas de revistas, jornais e conversas entre amigos. Um dos filmes mais marcantes de nossa geração foi inclusive sobre este tema. O famoso e hoje clássico Jogos de Guerra (War Games) de 1983, que assisti quando tinha uns 15 ou 16 anos. Por conta de tudo que li, ouvi e conversei a respeito da Guerra Fria, mais tarde a escrever diversos poemas usando o tema.

    Não há nada de poético em uma guerra, muito menos quando se trate de uma que pode exterminar a humanidade por completo. Porém, um dos efeitos daquela guerra psicológica era justamente o estado de tensão constante de que algo poderia e iria acontecer a qualquer momento. Este acontecimento seria uma guerra de proporções nunca antes vista. Foi por conta deste estado constante de ansiedade em relação ao que pode vir a acontecer um dia que surgiu a idéia de comparar a Guerra Fria a uma paixão não correspondida.


    nação distante

    uma fila de tanques
    um filho gritante
    (da nação distante)

    um Nobel da paz
    um notável capaz
    (da nação distante)

    uma fila armada
    com armas de fogo

    uma fila armada
    com armas de flores

    um acerto de cúpula
    um cerco à culpa
    (da nação distante)

    um muro no chão um mundo de confraternização (da nação distante)

    Não há data na página deste poema no meu caderno de poesias, mas como o Nobel da paz de 1990 foi anunciado no dia 15 de outubro de 1990, decidi atribuir esta data a este post, já que o poema, indiretamente, menciona Mikhail Gorbachev.


    Só o Amor Destrói

    Vejo através
    de fragmentos da parede de concreto

    Vejo através
    de frações de um mundo incerto
    provas do que mudou
    do que diziam ser certo
    restos do que acabou
    do que era perpétuo

    Um muro Alemão
    e são tantos mais
    fronteiras sem razão
    guerra na Praça da Paz
    “Só o amor destrói”
    o que só o ódio constrói

    Vejo através
    de filas de tanques de guerra
    Vejo através
    de filhos que amam sua Terra
    provas do que mudou
    do que diziam ser certo
    restos do que acabou
    do que era perpétuo

    Vejo através
    de homens que não cansam de sonhar
    Vejo através
    de sonhos que não param de realizar

    Cai um muro alemão
    e o de outras terras mais
    não há fronteiras sem razão
    só paz na praça da guerra
    “Só o amor destrói”
    o que só o ódio constrói

    Em 1990 ganhei, não me recordo de quem, um fragmento do Muro de Berlim dentro de um pequeno envelope com a frase “SÓ O AMOR DESTRÓI” impressa na parte externa.

    Na parte interna desse envelope, que guardo até hoje, há um pequeno texto dizendo que o fragmento foi trazido ao Brasil por Wolger Wey, que honestamente não faço a menor idéia de quem seja. Por curiosidade, recentemente procurei informações na Internet mas não há nenhuma referência ou vínculo que eu tenha encontrado de uma pessoa com este nome e o Muro de Berlim.

    Confirmar a legitimidade do fragmento nunca foi algo que me importou e continua não sendo importante agora. O que está vivo na minha mente até hoje são as imagens que vi na televisão de uma multidão de pessoas derrubando um muro que nunca deveria ter existido. Isso é o que realmente importa!

    Lembro também que quando recebi o fragmento de presente, as imagens do muro sendo derrubado e a multidão passando pelo Portão de Brandeburgo começaram a se repetir na minha mente me fazendo pensar em quanto ódio foi necessário para construir um muro — e tantos outros tipos de muro que depois dele surgiram — dividindo famílias e amigos. Foi esse sentimento que me fez escrever o poema que ganhou o nome “Só o Amor Destrói”.


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